Filipe Vale [ORANGE 3] desmonta a mensagem do novo videoclip «Promessas Vazias»



«Promessas Vazias» foi lançado a 15 de Junho e voltou a centrar atenções nos ORANGE 3. O novo single e videoclip do projecto micaelense é um consistente arranjo de rock desatado e funk irrequieto, não obstante elegante e de “ténis polido”, o que não faz deles meninos de coro ou estouvados poetas de karaoke. A mensagem revela-se profunda, intrigante e mobilizadora. E tudo isto na língua de Camões.

 

Foi precisamente por este último factor que arrastámos Filipe Vale para a mesa e lhe perguntámos, afinal, como é transmitir uma mensagem “sem filtros” – isto é, na língua materna. “Cantar em inglês é, por vezes, mais fácil, reconheço. Digamos que a sonoridade acaba por ser mais ‘leve’ ao ouvido, enquanto a construção das frases tende a ser mais simples – algo muitas vezes banal em inglês acaba por soar bem, ao passo que em português pode parecer forçado ou menos apelativo.”

 

Por essa perspectiva, fizemos uma breve viagem no tempo para confrontá-lo com a situação de, sobretudo nos anos 1990, os músicos açorianos serem criticados por se expressarem em inglês e até se dirigirem dessa forma ao público durante os concertos. Filipe Vale ajeita o discurso, com parcimónia: “Tudo depende da identidade do músico ou da banda, e da língua em que se sentem mais confortáveis a compor e transmitir uma mensagem. No nosso caso, nunca descartámos a possibilidade de explorar temas em inglês, ainda que, neste momento, queiramos afirmar-nos na nossa língua-mãe, que é incrivelmente rica e expressiva!”

 

Nas entrelinhas, e até fora delas, lê-se que a arte é inextricavelmente um acto de liberdade, que permite que “cada um receba a mensagem à sua maneira e dela tire as suas próprias conclusões”, preconiza Filipe Vale. Nesse pressuposto, entende como legítima e natural a decisão de escreverem em português. “A nossa língua é riquíssima! Está cheia de expressões idiomáticas, figuras de estilo, entoações e todos os recursos que derivam da gramática, desde um vocabulário vasto até uma sonoridade melódica e flexibilidade gramatical únicas. Acho mais desafiante escrever em português!” Ainda que o inglês não fique muito atrás em termos de complexidade, diz o vocalista, a língua portuguesa “exige um cuidado especial, para que o resultado soe bem e apresente uma dinâmica fluida com a música”.

 

Puxámos então à conversa «Promessas Vazias», até para aferir se cantar em português é, afinal, uma ponte privilegiada para atingir os corações dos ouvintes. Socialmente, vivemos tempos conturbados, e nem que fosse por isso, sugeria-se que a arte veiculasse mensagens de paz e amor. Contudo, «Promessas Vazias», embora nos iluda, é tudo menos um tema romântico, ainda que navegue por costas voltadas, expressões amuadas e alianças atiradas ao chão. “É o oposto do amor”, explica Filipe Vale, com toda a assertividade. A narrativa assenta numa “reflexão sobre o modo como o ser humano vive hoje em dia – cada vez mais individualista, centrado em si próprio e, muitas vezes, sem esforço real ou vontade de fazer acontecer.”

 

Desmontada a putativa “pieguice” da canção, o vocalista reforça que a “tensão entre o querer e o não agir” é o eixo central da mensagem, desencadeada pela “falta de empatia e respeito pelo outro”, que faz com que vivamos numa “constante desilusão, apontando o dedo ao mundo, mas sem assumir responsabilidade pelas próprias escolhas”. A surpreendente dureza poética do tema revela-se, assim, um exercício sinuoso de contradições e dicotomias, que Filipe Vale diz ter deixado “propositadamente em aberto” para tornar a experiência musical mais profunda e marcante.

 

Os ORANGE 3 são originários de Ponta Delgada e formaram-se em Março de 2024 por Filipe Vale, David Melo (guitarra) e Alexandre Moniz (bateria), aos que se juntou Fábio Cerqueira (baixo) em Outubro. Deram-se a conhecer com o single e videoclip «Sonhos Lançados», a 8 de Março do corrente, e estrearam-se ao vivo no passado dia 14 de Junho na cervejaria Vulcana, na Ribeira Grande. Ambos os videoclips foram produzidos pela S&N Intercut Films, enquanto a produção musical é assegurada pela própria banda no seu Black Orange Studio.




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